terça-feira, 17 de junho de 2014

ALAGOA GRANDE RELEMBRA 10 ANOS DA TRAGÉDIA DE CAMARÁ


 A barragem foi construída na gestão do governador José Maranhão (PMDB) e rompeu durante a administração do hoje senador Cássio Cunha Lima (PSDB).
O acidente da  Barragem de Camará ocorreu na noite de 17 de junho de 2004 . Após o rompimento as águas inundaram parte dos municípios de Alagoa Grande, Mulungu, Alagoa Nova e Areia. A tragédia ocasionou a  morte de cinco pessoas e deixou cerca de três mil desabrigados.  A construção da citada barragem custou aos cofres do Estado da Paraiba a quantia de R$ 24 Milhões de Reais.
Cinco minutos de conversa sobre Camará e dona Lourdes Martins desaba no choro. É a história dela que será contada nesta segunda matéria da série a tragédia de Camará, que completa 10 anos hoje.
Prestes a completar 70 anos, a aposentada ainda chora pelas perdas materiais que teve em consequência do rompimento da barragem. Devido ao abalo emocional, ficou com a saúde fragilizada e precisa tomar remédios para controlar a pressão arterial e os nervos.
Dona Lourdes morou praticamente a vida inteira em Alagoa Grande. Chegou ainda menina com os pais. Anos mais tarde casou e foi morar em uma casa na rua do Rio. A mesma casa onde nasceram os filhos. A mesma casa que foi completamente destruída pelas águas de Camará no dia 17 de junho de 2004.
“Não gosto de lembrar desse dia, eu sofro tanto, você nem imagina”, declarou.
No dia que recebeu a equipe de reportagem, a aposentada tinha um semblante triste e um olhar distante. Chorou em alguns momentos. “Perdi o gosto pela vida”, declarou dona Lourdes, que perdeu a casa, os móveis, as roupas e a feira que havia feito no dia anterior à tragédia para passar o mês. “Lembro que a gente saiu correndo daqui para a parte alta da cidade. A água deu no pescoço, pensei que a gente ia morrer”, contou.
Dona Lourdes, a filha e o genro ficaram na casa de parentes. No dia seguinte, ela quis ir até a casa onde morava – até então não tinha dimensão do desastre – mas foi impedida pelos familiares.
“Perguntei se eu tinha perdido a televisão e minha filha me olhou nos olhos e disse que a gente só tinha mesmo a ‘roupa do corpo’, tudo foi destruído”, relembrou. A televisão ela havia comprado recentemente com o dinheiro que o filho mandou de São Paulo. O aparelho era a distração da aposentada.
As águas de Camará também destruíram a máquina de costura que dona Lourdes havia comprado de uma vizinha, após 2 anos de economia. O marido dela morreu 2 anos antes da tragédia e a aposentada ainda se recuperava da perda. Uma semana após Camará invadir Alagoa Grande, ela começou a tomar remédios controlados, após ser diagnosticada com hipertensão. Dona Lourdes, que agora tem dificuldades de locomoção, passou a não querer sair de casa; evitava conversar com a vizinhança para não sofrer mais.
A filha e o genro dela também se incomodam ao lembrar do dia 17 de junho de 2004. Casados há poucos meses, perderam todos os presentes que ganharam de amigos e familiares. Nem a certidão de casamento escapou. O jovem casal teve de tirar a segunda via para comprovar a união. Fábio Rodrigues, o genro, ajudou no resgate dos vizinhos. “Lembro de muita gente chorando e desmaiando. Naquele momento eu só pensava em salvar vidas, fiz o que estava ao meu alcance, mas de repente a água subiu muito e eu tive de ir embora para não morrer”, contou.
Segundo ele, na rua do Rio, as águas de Camará atingiram 2,20 metros de altura.
Na casa de dona Lourdes a tristeza é maior porque a família ainda não recebeu a indenização, mesmo após 10 anos.
Desconsolada, ela disse que perdeu a esperança na Justiça, mas admite que precisa do dinheiro para reconstruir a casa.
“Depois de tanto tempo é difícil acreditar que esse dia vai chegar, prefiro não me iludir. Sofro menos assim”, afirmou.
Amanhã, na terceira reportagem da série sobre os 10 anos da tragédia de Camará, o JORNAL DA PARAÍBA conta o drama do mecânico José Soares, cujo pai morreu arrastado pelas águas.
O rompimento da barragem provocou cinco mortes nas cidades de Alagoa Grande e Mulungu, no Brejo paraibano. Para os familiares das vítimas, relembrar Camará é o mesmo que reviver os dias de agonia e tristeza que ficarão para sempre guardados na memória.

Jornal da Paraiba - Valéria Sinésio

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